segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Um idiota, parte 1

Ele era uma criança no corpo de um adulto. Para os que não o conheciam - ou que não queriam acreditar ou lembrar que o conheciam -, o rosto, quando sério, denotava gravidade e seriedade, e desta forma esperavam algo dele (‘talvez’, diziam entre si, ‘ele pode nos ensinar alguma coisa’). Mas, era apenas eles lhe permitir abrir a boca para falar algo, dar-lhe condições para se manifestar, e algo estranho de súbito já começava a surgir. Primeiro, pressentia-se algo de errado (‘será que é isso mesmo?’, pensavam), e prosseguiam o exame até o momento de sentirem-se inteiramente à vontade de sentenciarem, abertamente entre si, não raro com gargalhadas e galhofas: ‘sim, é isso mesmo’! Posteriormente, remexendo consigo as memórias de quando estivera com os outros (e muito amiúde ele fazia isso, já em sua solidão), o adulto envergonhava-se do que a criança falara - e pior, de como a criança falava. Mesmo forçando interpretar um adulto, a teimosia da criança fazia-se imiscuir em suas palavras, em seus gestos, em sua postura, em seu olhar. Apesar das tentativas em dominar a língua dos adultos, a sua ingenuidade colapsava o engenho necessário para tanto. A consequência disso era uma criança no corpo de um adulto. O adulto era triste. A criança também.